Adrieli de Fátima Massaro Levorato1; Selma Maffei de Andrade2; Giovana Frazon de Andrade3; Edmarlon Girotto2,4
DOI: 10.47626/1679-4435-2023-1054
RESUMO
INTRODUÇÃO: Professores, especialmente os da educação básica, têm enfrentado inúmeras condições desfavoráveis de trabalho, o que gera insatisfação no trabalho, com prejuízo à sua saúde física e mental, contribuindo para o absenteísmo. Objetivos: Verificar a associação entre menor satisfação no trabalho e absenteísmo por problema de saúde de curto e longo prazos em professores do ensino fundamental e médio.
MÉTODOS: Estudo observacional, analítico, individual, transversal, retrospectivo de coorte com professores do ensino fundamental e médio (n = 899). O absenteísmo foi determinado pelo relato de falta nos últimos 12 meses por motivo de saúde, categorizado em curto prazo (1 a 7 dias) e longo prazo (8 dias ou mais). A satisfação no trabalho foi mensurada pela escala Occupational Stress Indicator, categorizada em menor satisfação (até o percentil 25) e maior satisfação (acima do percentil 25). Foi utilizada a regressão logística multinomial, com cálculo da odds ratio como medida de associação.
RESULTADOS: Dos professores avaliados, a maioria era do sexo feminino (68,3%), tinham média de idade de 42 ± 10 anos e apresentavam vínculo estatutário (69,1%). As chances de absenteísmo foram maiores entre os professores do sexo feminino, mais jovens, com vínculo estatutário, que referiram dor ou doença crônica e que relataram capacidade física ou mental para o trabalho moderada/baixa. Professores menos satisfeitos apresentaram maiores chances de absenteísmo de curto e de longo prazo. Após os ajustes realizados, a satisfação no trabalho associou-se apenas ao absenteísmo de curto prazo.
CONCLUSÕES: Houve associação entre absenteísmo e menor satisfação no trabalho, tornando-se necessárias medidas para melhorar a satisfação no trabalho.
Palavras-chave: absenteísmo; professores escolares; satisfação no emprego.
ABSTRACT
INTRODUCTION: Teachers, especially those in primary education, face unfavorable working conditions, which lead to job dissatisfaction and affect their physical and mental health, thus contributing to absenteeism.
OBJECTIVES: To verify the association between lower job satisfaction and absenteeism due to short and long term health problems in elementary and hight school teachers.
METHODS: This observational, analytical, individual, cross-sectional, retrospective cohort study included 899 elementary and high school teachers. Absenteeism was determined by self-reported absences in the last 12 months for health reasons, categorized as short term (1-7 days) or long term (≥8 days). Job satisfaction was measured by the Occupational Stress Indicator scale, categorized as lower satisfaction (≤25th percentile) or higher satisfaction (>25th percentile). Multinomial logistic regression was used, and the odds ratio was calculated as a measure of association.
RESULTS: The majority of the teachers were women (68.3%) and were permanently employed (69.1%); the mean age was 42 (SD, 10) years. Women, younger teachers, permanent employees, those reporting chronic pain or illness, and those reporting a moderate/poor level of physical or mental work capacity had a higher risk of absenteeism. Lower job dissatisfaction was associated with short-term and long-term absenteeism. Job satisfaction was only related to short-term absenteeism after the adjustments made.
CONCLUSIONS: There was an association between absenteeism and lower job satisfaction, which indicates that measures to improve job satisfaction are necessary.
Keywords: absenteeism; school teachers; job satisfaction.
INTRODUÇÃO
O trabalho docente é constituído de inúmeras atividades acadêmicas e administrativas que vão muito além do ato de ensinar, pois envolve planejamento e preparo, desenvolvimento de avaliações, preenchimento de inúmeros documentos e participação em reuniões, sendo muitas dessas atividades realizadas fora do horário de trabalho1. Consequentemente, a sobrecarga dessas funções gera diversos problemas de saúde, como dores osteomusculares e distúrbios psíquicos2,3.
No Brasil, nota-se, ainda, a precarização do trabalho de professores da educação básica, o que tende a reduzir a satisfação no trabalho4,5. Os elementos causais da insatisfação no trabalho estão associados aos problemas e desafios do cotidiano laboral, como baixa remuneração, violência escolar, infraestrutura inadequada, entre outros fatores6,7. Esses aspectos são qualificados individualmente a partir de crenças, valores e perspectivas pessoais, comprometendo a atividade laboral refletida em distúrbios de saúde física e mental8 e absenteísmo9,10.
O absenteísmo, conceituado pelo não comparecimento do indivíduo ao trabalho, é um fenômeno multicausal determinado por fatores como as próprias condições de saúde, o ambiente laboral e a natureza da atividade desenvolvida11,12. Esse problema tem se mostrado recorrente em professores do ensino fundamental e médio, podendo repercutir em prejuízos no processo educativo13, denotando a importância de se investigar melhor os determinantes desse evento.
Evidências identificaram os preditores do absenteísmo entre trabalhadores de diversas profissões, como dores osteomusculares e doenças crônicas14, carga horária, intensidade do trabalho, cansaço físico e mental, além de fatores sociodemográficos, como situação conjugal, idade e gênero13,15. Em professores da educação básica brasileira, os vários componentes averiguados apresentaram maior magnitude de associação ao absenteísmo, especialmente diante do relato de estresse na escola e problemas emocionais7.
Investigações sobre a relação entre satisfação no trabalho e absenteísmo são pouco investigadas, sendo que os estudos que abordaram essa associação focaram principalmente profissionais de saúde9,10,16,17 ou trabalhadores em geral18,19, não sendo localizados estudos dessa temática entre professores da educação básica. Compreende-se que o absenteísmo é um problema multifatorial, e a investigação mais aprofundada de outros aspectos causais, como a satisfação no trabalho, poderá incutir diferentes visões e perspectivas sobre o dimensionamento do problema, além de identificar os cenários aos quais os docentes estão expostos. Diante disso, o objetivo deste trabalho foi verificar a associação entre menor satisfação no trabalho e absenteísmo por problema de saúde de curto e longo prazos em professores do ensino fundamental e médio, independentemente de características demográficas, socioeconômicas e de condições de saúde.
MÉTODOS
DESENHO DO ESTUDO
Trata-se de estudo transversal e integrante do projeto de pesquisa "Saúde, Estilo de Vida e Trabalho de Professores da Rede Pública do Paraná (Pró-Mestre)". Todas as informações deste estudo foram apresentadas de acordo com a iniciativa STROBE (Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology)20.
LOCAL E POPULAÇÃO DE ESTUDO
A população de estudo foi composta por todos os professores que atuavam no ensino regular fundamental e médio das 20 escolas com maior número de docentes da rede estadual de Londrina, estado do Paraná. Essas escolas foram selecionadas de forma intencional para a pesquisa, para facilitar a logística e porque atuavam nelas cerca de 70% dos professores do ensino fundamental e médio da rede estadual do município. Foram identificados, nessas escolas, por meio do Núcleo Regional de Educação de Londrina, 1.251 professores atuantes.
Para a inclusão no presente estudo, o professor deveria contar com pelo menos um ano na profissão docente. Foram excluídos professores readaptados ou em processo de readaptação, isto é, com condições de saúde que impediam de forma permanente o exercício da docência. Também foram excluídos professores que se afastaram do trabalho por 180 dias ou mais nos 12 meses anteriores à coleta de dados, devido ao menor tempo de exposição ao trabalho docente. Não houve processo amostral, pois todos os professores das escolas selecionadas foram abordados se atendessem aos critérios de inclusão e exclusão.
COLETA DE DADOS
Realizou-se estudo-piloto com 82 professores em 3 escolas de um município vizinho para avaliar aspectos relativos aos procedimentos do estudo e testar os instrumentos de coleta de dados.
A coleta de dados ocorreu de agosto de 2012 a junho de 2013, em local reservado na própria escola onde atuava cada professor e durante o período em que não estava ministrando aulas. A investigação foi realizada por meio de entrevista por pesquisadores treinados, os quais receberam um manual de apoio para a aplicação do instrumento de coleta, com duração aproximada de 40 minutos. Após a entrevista, aplicou-se um questionário autorrespondido pelo professor, com duração de cerca de 10 minutos. A aplicação do questionário autorrespondido foi uma estratégia adotada para obter respostas para questões mais sensíveis, como renda familiar mensal, e aplicar escalas de saúde para as quais autorrespostas são recomendadas. Todas as entrevistas foram realizadas em ambientes privados, garantindo o sigilo das informações fornecidas.
Dos 1.251 professores das escolas selecionadas para o estudo, 138 foram excluídos (125 por serem readaptados, 9 por tempo de profissão inferior a 1 ano e 4 por referirem afastamento superior a 180 dias nos 12 meses anteriores à coleta de dados). Assim, 1.113 professores foram considerados elegíveis para a pesquisa. Desses, 214 foram considerados perdas (65 por licença, 63 recusas, 20 não localizados, 50 por não preencherem completamente a escala de satisfação no trabalho e 16 por falta de resposta ou inconsistências em relação às perguntas sobre absenteísmo). Portanto, a amostra final deste estudo foi constituída por 899 professores (80,8% dos elegíveis).
VARIÁVEIS DE ESTUDO
O absenteísmo, variável dependente deste estudo, foi determinado da seguinte forma: todos os professores que relataram ter faltado nos últimos 12 meses por motivo de saúde foram questionados quanto ao número de dias inteiros de falta ao trabalho. Posteriormente, para análises, o absenteísmo foi categorizado em curto prazo (faltas de 1 a 7 dias) e longo prazo (faltas de 8 dias ou mais). Não foram consideradas as licenças maternidade/paternidade e faltas devido a consultas ou procedimentos rotineiros de pré-natal.
A variável independente analisada foi a satisfação no trabalho, mensurada pela escala de satisfação no trabalho Occupational Stress Indicator (OSI)21, traduzida para o português brasileiro e validada por Swan et al.22. Essa escala é constituída por 22 questões sobre satisfação com aspectos do trabalho (por exemplo, salário, volume de trabalho e relacionamentos), com possibilidade de respostas por níveis de satisfação (enorme satisfação, muita satisfação, alguma satisfação, alguma insatisfação, muita insatisfação e enorme insatisfação). O somatório das respostas pode variar entre 22 (menor satisfação) a 132 (maior satisfação). Como não existe ponto de corte validado para essa escala, neste estudo, optou-se por utilizar o percentil 25 para categorizar a variável em menor satisfação (até o percentil 25, inclusive) e maior satisfação (acima do percentil 25).
As variáveis de ajuste foram demográficas e socioeconômicas [sexo - masculino e feminino; idade, em tercis - 23 a 35 anos, 36 a 46 anos, 47 a 68 anos; situação conjugal - com companheiro e sem companheiro; tipo de contrato de trabalho - temporário e permanente (estatutário); renda mensal familiar - ≤ R$ 3.000,00 e > R$ 3.000,00] e variáveis relacionadas às condições de saúde (dor crônica referida - sim e não; doença crônica - sim e não; percepção da capacidade física para o trabalho - muito boa/boa, moderada/baixa; percepção da capacidade mental para o trabalho - muito boa/ boa, moderada/baixa). Foi considerada dor crônica a afirmativa de dores frequentes em uma ou mais regiões do corpo com duração igual ou superior a 6 meses23. Foram consideradas as seguintes doenças crônicas referidas como diagnosticadas por médico: hipertensão arterial, diabetes, depressão, ansiedade, artrite, artrose, reumatismo, asma, enfisema, bronquite, tumor maligno, insuficiência cardíaca, tuberculose pulmonar e doença renal.
MÉTODOS ESTATÍSTICOS
Os dados contidos nos instrumentos de coleta foram conferidos por coordenadores de campo e, posteriormente, realizou-se dupla digitação e comparação dos dois arquivos com uso do programa Epi Info versão 3.5.4, com correção das discrepâncias encontradas. Em seguida, realizou-se tabulação dos dados com o programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 19.0.
Foi realizada análise descritiva por distribuição das frequências absolutas e relativas das variáveis qualitativas e por medidas de tendência central e dispersão para as variáveis quantitativas. Também se analisou a confiabilidade da escala de satisfação no trabalho utilizando o coeficiente alfa de Cronbach. Para as análises bivariadas e multivariadas, foi utilizada a regressão logística multinomial, com cálculo da odds ratio (OR) como medida de associação, com seus respectivos IC95%. Nessas análises, para o absenteísmo (variável dependente), foram consideradas as seguintes categorias: ausência de absenteísmo (referência), faltas de 1 a 7 dias (curto prazo) e faltas de 8 dias ou mais (longo prazo). Ainda, foi realizada a matriz de confusão do modelo para avaliação da sensibilidade e dos casos classificados corretamente.
Na análise da relação entre satisfação no trabalho e absenteísmo, foram construídos dois modelos ajustados, com inclusão das variáveis sexo, idade e daquelas que apresentaram p < 0,20 na análise não ajustada. As variáveis que compuseram cada modelo foram: Modelo 1 - variáveis socioeconômicas e demográficas; Modelo 2 - variáveis do Modelo 1, acrescidas das variáveis relacionadas às condições de saúde.
ASPECTOS ÉTICOS
O projeto Pró-Mestre foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Londrina (CAAE nº 01817412.9.0000.5231). Os entrevistados foram devidamente orientados quanto aos objetivos da pesquisa e, após esclarecimento de dúvidas, leitura, concordância e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, a coleta de dados foi conduzida.
RESULTADOS
Dos 899 professores avaliados, a média de idade foi de 42 ± 10 anos, com mínima de 23 e máxima de 68 anos. O tempo médio de profissão foi de 14 ± 9 anos, com variação entre 1 e 45 anos. Houve predominância de professores com contrato de trabalho permanente (estatutário) (69,1%). Pouco menos da metade dos professores referiu dor crônica (42,8%), e a maioria referiu ter alguma doença crônica (84%).
A média de pontos da escala de satisfação no trabalho (OSI) foi de 84, com mediana de 85, mínima de 26 e máxima de 131 pontos. O ponto de corte adotado (percentil 25) correspondeu a 72 pontos, com 229 professores considerados menos satisfeitos. O coeficiente alfa de Cronbach identificado para a escala de satisfação no trabalho neste estudo foi de 0,943.
Os componentes da escala que apresentaram menores níveis de satisfação, de acordo com as opções de resposta (enorme insatisfação ou muita insatisfação), foram: salário (46,9%), volume de trabalho (29,6%) e oportunidades para atingir aspirações e ambições (21,5%).
Dos professores entrevistados, 453 (50,4%) relataram ter faltado ao trabalho por problema de saúde nos 12 meses anteriores à pesquisa: 31,5% por 1 a 7 dias (absenteísmo de curto prazo) e 18,9% por 8 dias ou mais (de longo prazo). Entre os professores que referiram faltas, a média de dias inteiros fora do trabalho foi de 7,5 dias (±27,3); a mediana foi 5,0, com mínimo de 1 e máximo de 180 dias. Outras características dos professores participantes do estudo podem ser verificadas na Tabela 1.
O sexo feminino e o tipo de contrato estatutário associaram-se ao absenteísmo de longo prazo. A idade de 23 a 35 anos associou-se tanto ao absenteísmo de curto quanto ao de longo prazo. A idade de 36 a 46 anos associou-se apenas ao absenteísmo de curto prazo. Também se detectou associação de dor crônica, doença crônica e percepção de capacidade mental para o trabalho moderada ou baixa tanto com absenteísmo de curto quanto com o de longo prazo. A percepção de capacidade física para o trabalho moderada ou baixa associou-se apenas ao absenteísmo de longo prazo (Tabela 2).
Os professores menos satisfeitos apresentaram maiores chances de absenteísmo de curto (OR 1,89; IC95% 1,34-2,67) e de longo prazo (OR 1,87; IC95% 1,25-2,79). Após ajuste por sexo, idade e tipo de contrato (Modelo 1), a satisfação no trabalho manteve-se associada tanto ao absenteísmo de curto quanto ao de longo prazo (Tabela 3).
Após todos os ajustes (Modelo 2), a satisfação no trabalho associou-se apenas ao absenteísmo de curto prazo (Tabela 3). Professores mais jovens também apresentaram maior frequência de absenteísmo de curto prazo: 23 a 35 anos (OR 1,89; IC95% 1,23-2,90) e de 36 a 46 anos (OR 1,63; IC95% 1,11-2,40). Houve, ainda, associação entre tipo de contrato estatutário (OR 1,83; IC95% 1,12-2,98) e relato de dor crônica (OR 1,55; IC95% 1,05-2,27) com absenteísmo de longo prazo. Professores que referiram doença crônica apresentaram maior frequência de absenteísmo de curto (OR 2,07; IC95% 1,32-3,25) e de longo prazo (OR 4,13; IC95% 1,91-8,91). Conforme matriz de confusão gerada, a sensibilidade de modelo final chegou a 76,9%, e 52,3% dos casos foram classificados corretamente.
DISCUSSÃO
A menor satisfação no trabalho manteve-se associada ao absenteísmo de curto prazo em todos os modelos ajustados, ainda que se tenha detectado redução da odds ratio no modelo que incluiu as condições de saúde. Com relação ao absenteísmo de longo prazo, percebeu-se perda de significância estatística no modelo final, com inclusão das variáveis de condições de saúde. Assim, é possível supor que a presença de dor e/ou de doença crônica seja um fator mais importante no absenteísmo de longo prazo em comparação à menor satisfação no trabalho. Em contrapartida, pode-se sugerir que a insatisfação no trabalho é um importante preditor de absenteísmo de curto prazo.
Embora não se tenha identificado, em diversas bases de dados (SciELO, LILACS, PubMed, entre outras), estudos com professores que avaliaram a relação entre satisfação no trabalho e absenteísmo, estudos com outras populações verificaram que a menor satisfação no trabalho apresenta associação positiva com o absenteísmo9,10,17,19,24. Uma pesquisa com 874 trabalhadores de um hospital público do Chile10verificou que a insatisfação no trabalho foi importante preditora de absenteísmo, mesmo após ajustes por sexo, idade, nível hierárquico e clima psicológico no hospital. Da mesma maneira, Oenning et al.24 identificaram, em estudo caso-controle com trabalhadores da indústria petrolífera brasileira, que aqueles que relataram insatisfação no trabalho foram os que mais se afastaram por licença médica. Assim, apesar de o presente estudo avaliar uma população de professores, os seus resultados somam-se aos de outros estudos para atestar a necessidade de se averiguar os níveis de satisfação no trabalho dos professores do ensino fundamental e médio com o objetivo de adotar ações pertinentes e reduzir a insatisfação e, consequentemente, diminuir os índices de absenteísmo, especialmente os de curto prazo, bem como os prejuízos relacionados a esse problema.
Também se observou que professores mais jovens apresentaram maiores chances de absenteísmo de curto prazo em comparação com aqueles de idades mais elevadas. Wargo-Sugleris et al.25 observaram que as relações entre satisfação no trabalho e bem-estar geral são mais fortes para os trabalhadores mais velhos e, por isso, espera-se que indivíduos mais velhos, quando saudáveis, tenham menor número de faltas ao trabalho. Além disso, professores mais velhos, em geral, têm maior habilidade para lidar com conflitos devido à experiência profissional e, com isso, podem apresentar menores níveis de estresse e maior resiliência26.
Pôde-se perceber associação de doença crônica tanto com o absenteísmo de curto quanto com o de longo prazo e de dor crônica com o de longo prazo. A saúde dos professores encontra-se prejudicada, possivelmente resultante do desgaste físico e emocional vivenciado no trabalho, o que pode aumentar o risco de inúmeros agravos à saúde e levá-los a faltas não planejadas. Dos Santos & Marques27 apontam que as más condições de trabalho e o desgaste gerado por elas são grandes precursores do absenteísmo entre professores do ensino fundamental e médio.
Professores estatutários apresentaram chances mais elevadas de absenteísmo de longo prazo. Primeiro, professores temporários possivelmente têm maior dificuldade em obter licença médica de longo prazo, pois, após 15 dias de licença, têm que recorrer ao auxíliodoença da Previdência Social, com todo o processo burocrático que a solicitação desse auxílio envolve. Um segundo aspecto é que professores estatutários são, em geral, mais idosos, com mediana de 11 anos a mais em comparação aos temporários28. Embora a idade (em tercis) tenha sido incluída nas análises ajustadas, ela está associada a doenças crônicas e a outros problemas de saúde, não verificados pelo presente estudo, que, em última instância, estão associados ao absenteísmo de longo prazo.
A proporção de professores que relatou absenteísmo neste estudo foi de 50,4%, semelhante aos resultados do Estudo Educatel Brasil, realizado entre 2015 e 2016, com mais de 6.000 professores das cinco regiões brasileiras, que encontrou proporção de 53,3% de absenteísmo devido a doenças7. Todavia, estudos têm identificado níveis de absenteísmo inferiores ao observado na presente investigação29,30. Esses estudos identificaram o absenteísmo por verificação direta da presença do professor na escola durante a coleta de dados, não avaliando o período de 12 meses, que foi utilizado neste estudo. A alta proporção de absenteísmo detectada neste trabalho pode ser consequência de problemas com o bem-estar geral do professor. Em consequência, o trabalhador tende a recorrer a faltas, licenças temporárias e licenças sem vencimentos para se afastar do ambiente de trabalho após fadiga mental e insatisfação decorrentes do ambiente de trabalho31.
Uma das limitações da presente pesquisa é que a escala de satisfação no trabalho foi autorrespondida, com possibilidade de erros de interpretação pelo professor sobre o preenchimento do questionário. Além disso, a ausência no trabalho por problema de saúde (absenteísmo) foi questionada considerando um período de até 12 meses antes da entrevista, o que pode gerar viés de memória. Por outro lado, foram realizados alguns procedimentos para melhorar a validade interna do estudo: aplicação de estudopiloto, treinamento dos entrevistadores e elaboração de um manual de apoio, realização de entrevistas em ambientes privados e dupla digitação dos dados. Devese ressaltar, também, a alta confiabilidade observada pelo coeficiente de Cronbach (alfa = 0,943) para a escala de satisfação no trabalho.
Os resultados do presente estudo indicam que estratégias que visem a incrementar a satisfação no trabalho do professor podem, possivelmente, contribuir para a redução do absenteísmo, especialmente o de curto prazo, assim como para evitar possíveis impactos ainda mais negativos, como o abandono da profissão. Medidas como aumento do salário, redução do volume de trabalho e ampliação de oportunidades de crescimento profissional, dimensões da escala com piores avaliações pelos professores do presente estudo, poderiam ser priorizadas, entre outras que melhorem as condições gerais do trabalho do professor.
CONCLUSÕES
Em suma, pode-se concluir que a menor satisfação no trabalho se mostrou associada ao absenteísmo de curto prazo, independente das variáveis sexo, idade, tipo de contrato, dor crônica, doença crônica, e capacidade física e mental para o trabalho. Dessa forma, os resultados encontrados neste estudo apoiam a hipótese de que a menor satisfação é fator preditor para o absenteísmo.
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Recebido em
1 de Julho de 2022.
Aceito em
22 de Março de 2023.
Fonte de financiamento: Fundação Araucária (Chamada 24/2012 - Programa Universal - Pesquisa Básica e Aplicada - Protocolo 37472); Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (MCTI/CNPQ/Universal 14/2014 - Subsídio nº 459671)
Conflitos de interesse: Nenhum
Contribuições dos autores: AFML, SMA e EG foram responsáveis pela conceptualização estudo. AFML, GFA e EG realizaram a análise formal e a redação – esboço original do manuscrito. SMA foi responsável pela supervisão, e redação – revisão & edição. Todos os autores aprovaram a versão final submetida e assumem responsabilidade pública por todos os aspectos do trabalho.