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ARTIGO ORIGINAL

Considerações Toxicológicas da Exposição Ocupacional aos Fármacos Antineoplásicos

Toxicological Approach to Occupational Exposure to Antineoplastic Drugs

Isarita Martins1; Henrique Vicente Della Rosa2

RESUMO

Trabalhadores da área da saúde, em laboratórios, hospitais e/ou outros locais, estão potencialmente expostos a numerosos riscos ocupacionais. A ampla e crescente utilização de fármacos antineoplásicos, na quimioterapia, é considerada um importante risco químico para o pessoal envolvido no preparo e na administração dessas substâncias aos pacientes com câncer. O manuseio desses fármacos sem cuidados pode levar a inúmeros efeitos tóxicos. Alguns desses fármacos são classificados como carcinógenos ou provavelmente carcinógenos para humanos. Para tais agentes, é difícil atingir uma dose de não efeito observado, pois a patologia provocada por eles é considerada multifatorial. Todavia, a avaliação da exposição, através da monitorização ambiental e biológica, vigilância à saúde, programas de informação e treinamento de pessoal e utilização de equipamento de proteção individual e coletiva são algumas medidas recomendadas para controlar a exposição e proteger a saúde dos indivíduos que têm contato com os quimioterápicos antineoplásicos no ambiente de trabalho.

Palavras-chave: Exposição Ocupacional; Riscos Ocupacionais; Antineoplásicos; Agentes Antineoplásicos e Imunossupressores; Medidas de Segurança.

ABSTRACT

Health care workers, laboratories and hospitals workers and/or other locals have potential exposure to numerous occupational hazards. The widespread use of antineoplastic drugs in chemotherapy is considered an important risk to staff involved in the preparation and administration of these drugs. Careless handling of these drugs may lead to several toxic effects. Some antineoplastic drugs are classifíed as carcinogenic and probably carcinogenic for humans. It is difficult to determine what dosage of such carcinogenic agents which would have a non-adverse-effect-level because the pathology generated by them is considered multi-factorial. However, the assessment of exposure through environmental and biobgical evaluation, workers health surveillance, information and training programs, safety guidelines, and individual and collective protective measures like use of masks, gloves, laminar air-flow safety hoods are recommended to control the exposure and protect the health of the individuais who deal wilh antineoplastic agents during their occupational aclivities.

Keywords: Occupational Exposure; Occupational Risk; Antineoplastic Agents; Immunosuppressive Agents; Safety Measures.

INTRODUÇÃO

No ambiente hospitalar, a manipulação de fármacos antineoplásicos e imunossupressores, os procedimentos de esterilização com óxido de etileno e formaldeído e, ainda, a exposição aos anestésicos voláteis em salas de cirurgia, tais como o'halotano e o isoflurano, constituem riscos químicas genotóxicos.1-3

Os fármacos antineoplásicos são quimioterápicos utilizados no tratamento de algumas patologias, den* tre elas o câncer. Nesse caso, sâo empregados objetivando destruir as células tu morais, podendo agir direta ou indiretamente sobre elas. O tratamento moderno do câncer compreende cada vez mais a quimioterapia combinada e, às vezes, em associação com outros métodos de tratamento.4

Constituem uma categoria de fármacos cujo emprego está progressivamente aumentando, nos últimos decênios, como causa do crescente número de casos diagnosticados de neoplasias e da exigência de dispor de formulações sempre novas que ofereçam aos pacientes uma vida qualitativamente melhor.5

Convém salientar que nem todos os antineoplásicos são substâncias dotadas de ação carcinógena.6 A International Agency for Research on Cancer (IARC)7 reconhece como carcinógenos para o ser humano a ciclofosfamida, a N,N-bis(2-cloroetil)-2-naftilamina, a clorambucila e o melfalano, dentre outros. Pode ser observado na Tabela 1 que, além destes, a terapia composta por mostarda nitrogenada, vincristina, procarbazina e prednisona também é dotada de ação carcinógena humana.8

 

 

Como exemplos de grupos expostos podem ser citados os pacientes, os indivíduos que trabalham nas indústrias farmacêuticas, os trabalhadores que preparam e administram fármacos, os médicos e as enfermeiras que cuidam dos pacientes, o pessoal relacionado à limpeza, os familiares dos pacientes e os pesquisadores.

Uma importante questão a ser respondida com relação a esses fármacos é: se existe um risco químico para profissionais da área da saúde advindo da manipulação dessas substâncias, é possível mensurá-lo e preveni-lo de um modo adequado? Essa questão é de difícil solução, uma vez que demanda um processo de avaliação do risco ocupacional a tais substâncias, ou seja, a delimitação das etapas: hipótese do risco, demonstração do risco, medida do risco, medida dos efeitos e controle do risco.9

À luz de todas essas considerações, reveste-se de importância enfocar a categoria de trabalhadores que cuidam da saúde das pessoas, mas que, paradoxalmente, não recebem, muitas vezes, a devida atenção quanto aos riscos à sua própria saúde. Assim, este artigo aborda alguns aspectos toxicológicos dos fármacos antineoplásicos e os principais métodos de prevenção e controle dos riscos advindos da exposição ocupacional a esses xenobióticos.

 

ASPECTOS TOXICOLÓGICOS DOS FÁRMACOS ANTINEOPLÁSICOS

Os fàrmacos antineoplásicos constituem um grupo heterogêneo de substâncias químicas capazes de inibir o crescimento e/ou os processos vitais das células tumorais com uma toxicidade tolerável sobre as células normais.10,11 Podem ser classificados em agentes alquilantes; antimetabólitos, compostos de platina, antibióticos, produtos vegetais, hormônios e análogas e agentes diversos4 (Tabela 2).

 

 

Esses fármacos podem dispersar-se no ambiente de trabalho no estado sólido, na forma de pó ou, com maior freqüência, no estado líquido, na forma aerodispersa. A via percutânea é a principal via de absorção. Se a exposição é acompanhada de uma ação lesiva na pele, a absorção é facilitada.5

É estimado que, durante uma jornada de trabalho com manipulação desses fármacos, quantidades em torno de 0,5-250µg ou 10-12,5µL de uma solução 20 g/L podem estar disponíveis para contaminar a pele e representar risco para o trabalhador exposto. O uso de luvas diminui consideravelmente a contaminação dérmica.12

A absorção dessas substâncias pela via inalatória pode estar associada ao surgimento de efeitos diretos na mucosa das vias aéreas superiores e dos brônquios. A absorção por ingestão pode ser originada através da deglutição do muco proveniente do mecanismo de depuração brônquica, do contato das mãos contaminadas com a mucosa oral ou a ingestão de alimentos contaminados. Em casos de acidentes, podem ser absorvidos através da mucosa ocular.5

Após a absorção, são distribuídos ao nível sistêmico e se alojam nos tecidos-alvo, o que explica o efeito farmacológico, base tanto do efeito terapêutico quanto do tóxico. Da biotransformação, sobretudo hepática, compostos mais reativos que o precursor podem ser originados. A eliminação seja da forma inalterada ou biotransformada é, sobretudo, através da via urinária, com exceção de alguns fármacos excretados por via digestiva e eliminados com a bile.5

Efeitos Tóxicos

Os efeitos patológicos descritos nos indivíduos ocupacionalmente expostos são difíceis de demonstrar. Os estudos disponíveis sobre os danos reprodutivos sugerem a presença de uma associação causal, em particular um aumento do número de abortos, demonstrado em mulheres que manipulavam esses fármacos sem adoção de medidas preventivas adequadas, sobretudo no primeiro trimestre de gravidez. Os dados sobre a mortalidade causada pela presença de tumores dos trabalhadores expostos aos agentes antineoplásicos são ainda insuficientes para caracterizar esse grupo como sendo o de maior risco de desenvolver neoplasias causadas pela atividade ocupacional.6

A exposição dos trabalhadores encarregados da preparação e da administração dos antineoplásicos despertou atenção no final dos anos 1970 e os primeiros efeitos advindos do contato com essas substâncias eram exclusivamente do tipo agudo, em conseqüência do contato pela via cutânea ou por inalação, em casos de acidentes ou erros na manipulação.13 O interesse em pesquisar os efeitos genotóxicos de algumas substâncias, nos trabalhadores, aumentou nos anos 1980, década essa que coincide com o aumento da mortalidade por tumores, em indivíduos que trabalhavam em laboratórios.14-21

Cefaléia, vertigens, tonturas, queda de cabelo, hiperpigmentação cutânea e vômitos são efeitos observados em trabalhadores que preparam e administram antineoplásicos sem proteção coletiva ou individual, o que resulta em absorção considerável, sendo tais efeitos comparados àqueles apresentados por pacientes em tratamento com estas substâncias.22

Muitos desses fármacos são mutagênicos, carcinogênicas e teratogênicos em vários sistemas experimentais. Para um certo número de fármacos, principalmente os agentes alquilantes, isolados ou em combinação, é demonstrada a provável carcinogenicidade para o homem, manifestada pelo aparecimento de neoplasias secundárias em pacientes tratados.1

Os benefícios causados por tais agentes, para pacientes portadores de tumores, são inquestionáveis, porém não é possível negar o risco decorrente dá exposição a esses agentes, para os trabalhadores.11

Entre os efeitos biológicos precoces da exposição a substâncias mutagênicas/carcinogênicas, os efeitos citogenéticos nos linfócitos, tais como a freqüência de aberrações cromossômicas, troca de cromátídes-irmãs e presença de mícronúcleos, são os mais estudados e propostos para a avaliação; do risco de tumores no âmbito coletivo.23 Convém ressaltar que, nos estudos realizados em grupos de trabalhadores que adotam medidas protetivas, os indicadores citogenéticos resultam negativos.14

Alguns antineoplásicos são dotados de ação irritante e alergênica, que pode manifestar-se pelo contato cutâneo ou com mucosas, principalmente as mucosas nasal e orofaríngea. Vermelhidão cutânea, edema de mucosa, úlcera e estomatite são exemplos de efeitos encontrados em trabalhadores expostos a esses fórmacos, resultantes da ação irritante. Prurido, eritema ou presença de erupções cutâneas podem ser respostas imediatas da presença dessas substâncias. Edema de pálpebra, náuseas e dispnéia asmatiforme o, em casos de exposição aguda relevante, edema de glote são os efeitos resultantes da ação alérgica.22

Os efeitos sistêmicos são os que ocorrem no sistema hematopoiético (leucopenia, anemia e aplasia medular) ou em diversos órgãos e tecidos (aparelho auditivo, fígado, pâncreas, rins). Ainda podem ser observados efeitos cardíacos (miocardioesclerose), pulmonares (fibrose), periféricos e reprodutivos (diminuição da produção de espermatozóides e amenorréia). É importante salientar que esses são efeitos apresentados por pacientes em tratamento com tais substâncias, todavia podem ser verificados em trabalhadores expostos. O confronto dos resultados das avaliações, realizadas em grupos sanitários expostos e não expostos, demonstra maior freqüência de sintomatologia em trabalhadores expostos.22

 

AVALIAÇÃO DOS RISCOS E INTERVENÇÃO PARA A REDUÇÃO DA EXPOSIÇÃO

Não há conhecimento suficiente sobre o mecanismo de ação das substancias carcinogênicas, não permitindo, assim, a definição de um nível de exposição seguro, ao qual não se evidencia efeitos tóxicos. É, portanto, necessário que essa exposição seja mantida dentro dos níveis mais baixos possíveis.5,24

Maluf e Erdtmann11 realizaram um estudo de avaliação da freqüência de micronúcleos em dez indivíduos ocupacionalmente expostos a agentes antineoplásicos, em um hospital. Os resultados da primeira avaliação revelaram uma maior freqüência de linfócitos micronucleados nesses trabalhadores, sugerindo uma ação clastogênica, em relação ao grupo controle, composto de trabalhadores do mesmo hospital, porém não expostos aos antineoplásitos. Quatro anos depois, com adoção de melhores condições de trabalho, não houve diferenças estatisticamente significativas na avaliação do mesmo grupo de expostos em relação ao controle.

Enfermeiros apresentam aumento nos danos ao DNA relacionado à exposição ocupacional aos agentes antineoplásicos. Os resultados de um estudo realizado por Ündeðer et al.25, em 1999, demonstraram que esse efeito não foi verificado em grupos de enfermeiros, secretários e técnicos de laboratório que não manipulam tais agentes. Os autores demonstraram o possível risco genético para os indivíduos que manipulam os fármacos antineoplásticos, enfatizando a importância da adoção de medidas protetivas e de práticas de trabalho adequadas.

Em ambiente hospitalar, quando a exposição a essas substâncias é realizada sem precauções, os trabalhadores podem estar expostos ao risco de contato e/ou absorção nas atividades de manipulação da sustância para preparação da dose a ser administrada; na administração do fármaco ao paciente e no contato com excreções do paciente tratado. Os profissionais com maior envolvimento em tais atividades são da área de enfermagem e de farmácia.1,10

Durante a fase de preparação dos fármacos, a abertura da ampola, o contato com agulhas e seringas que contenham ou contiveram a substância, a transferência do conteúdo da ampola para o frasco e o acondicionamento incorreto de um frasco parcialmente utilizado são operações particularmente identificadas como arriscadas. Já na fase de administração, a exposição se deve à formação de aerossóis ou contato cutâneo direto.13,26

Monitorização da Exposição

Na monitorização dos antineoplásicos, muitas são as dificuldades tanto de ordem técnica quanto analítica Sendo assim, não existe um padrão mais adequado em relação ao tipo de amostragem e em relação ao método de análise que permita uma avaliação da exposição e do risco. É necessário conhecer a quantidade de substância manipulada, a modalidade de difusão no ambiente, caracterizar a área de maior contaminação, conhecer a via de absorção do antineoplásico em questão e a proporção entre a dose cutânea e respiratória, verificar a eficiência dos dispositivos de proteção coletiva e individual e conhecer a eventual transferência de microquantidades residuais presentes no ambiente de trabalho a áreas contíguas.

Os dados disponíveis demonstram que a determinação do antineoplásicos aerodispersos não é um método partícularmente sensível e, assim, não fornece indicações úteis sobre o nível de exposição dos trabalhadores. Quando essa informação se faz necessária, a amostragem da área e de pessoal deve ser realizada, individualizando pontos significativas, e particular atenção deve ser dispensada à área caracterizada como a de maior contaminação.26

Outros métodos para avaliar a exposição aos antineoplásicos compreendem: o emprego de pads, para avaliar a contaminação de zonas específicas do corpo do trabalhador, com particular referência ao tórax, às pernas e aos braços; o emprego de wipe test, para o controle da presença de resíduos sobre uma superfície específica ou objetos, nos locais de preparo e administração do fármaco. A análise da superfície é mais útil, sensível, reprodutível e a técnica para efetuá-la é de baixo custo e relativamente acessível. Do mesmo modo, a análise do fármaco em materiais, como luvas e máscaras, pode ser útil, quando corretamente padronizada.26-30

A determinação desses agentes em fluídos biológicos avalia o grau de exposição e absorção por todas as vias, independente da via de introdução, porém, atualmente, os métodos utilizados não apresentam baixa sensibilidade. Logo, esta análise só é válida quando a absorção for elevada, o que somente pode ser verificado em situações de ambiente não controlado. Biologicamente, as determinações mais utilizadas têm sido as não específicas, tais como a mutagenicidade urinária, a análise de aberrações cromossômicas e a troca de cromatides-irmãs.8,31

São individualizados, à luz dos conhecimentos atuais, os fármacos ciclofosfamida, 5- fluorouracila e os compostos de coordenação de platina, para avaliar a exposição potencial a mistura de antineoplásicos. Em uma escala de prioridade, para a escolha da amostra que melhor demonstre a exposição, aquelas obtidas de superfície de trabalho ocupam o primeiro lugar, seguida das amostras biológicas e, por último, das amostras de ar.26

Para a obtenção das informações deve ser utilizado um questionário caracterizando, assim, toda a atividade pertinente ao emprego e ao contato com os fármacos. O questionário, além de fornecer dados sobre as condições de trabalho, garante uma correta impostação da monitorização ambiental e biológica, pois a avaliação do ambiente de trabalho e da exposição, neste caso, apresenta notáveis dificuldades, entre elas a necessidade de avaliar, no ambiente, os mais diversificados valores de exposição.26

A técnica de monitorização, seja ambiental, seja biológica, deverá ser capaz de refletir a exposição e depende da confiança na metodologia utilizada. Assim, é de fundamental importância que o método empregado seja previamente validado.

Adoção de Programas de Formação e Informação

Os organismos nacionais e internacionais responsáveis pela segurança dos trabalhadores têm elaborado documentos que pretendem fornecer uma indicação precisa da redução dos riscos durante a fase de manipulação dos fármacos antineoplásicos. Em geral, as diretrizes propõem a avaliação periódica da exposição, a utilização de equipamento de proteção individual e coletiva, a realização de vigilância sanitária e dos programas de instrução, formação e informação, com a finalidade de garantir os níveis mais baixos possíveis de exposição, partindo do pressuposto que esta não pode ser evitada pelos profissionais da área da saúde.5

O documento reconhecido como completo a nível mundial é aquele elaborado em janeiro de 1986 (revisado em 1995 e 1999) pela Occupational Safety and Health Adiministration (OSHA); órgão do Departamento do Trabalho dos Estados Unidos. Esse documento individualiza dois elementos essenciais: a informação e a formação para os trabalhadores envolvidos na manipulação dos antineoplásicos e o emprego de cabine de fluxo laminar (classe II). Contém ainda uma síntese dos riscos iminentes à manipulação dos fármacos antineoplásicos, uma lista de procedimentos técnico-operativos e dos equipamentos necessários pára a redução da exposição e uma lista dos fármacos erti uso.32

Alguns autores avaliaram a aplicabilidade dessa norma nos anos seguintes à sua publicação e os estudos evidenciaram melhoras significativas das condições de trabalho. Nesse âmbito, destaca-se o estudo desenvolvido por Bordoni et al.33, em um departamento ginecológico de um hospital italiano. As enfermeiras recebiam informações, com suporte didático do farmacêutico e do médico responsável, sobre os agentes utilizados e as medidas de proteção individual e coletiva. Assim, com o envolvimento e a colaboração de todos os profissionais da saúde houve uma consistente diminuição dos riscos advindos da manipulação de fármacos antineoplásicos.

É recomendada a utilização de alguns materiais, dentre os quais conexões tipo luer lock entre a agulha e a seringa; seringa larga, firme e estável, feita de material quimicamente inerte e âmbar; agulha com filtro hidrofóbico, utilizada para estabelecer o equilíbrio entre a pressão interna do frasco e a atmosférica e evitar a formação de aerossol no momento em que se retira a agulha da seringa; e tela absorvente monouso, impermeáveis no lado inferior e absorventes no lado superior, para a contenção do risco da exposição nas fases de preparo e administração dos fármacos anti-neoplásicos.5

A tendência atual nos países desenvolvidos é utilizar o dispositivo de segurança conhecido como sistema fechado, o qual previne a liberação dos fármacos para o ambiente durante a preparação e a administração, pois é dotado de uma câmera de expansão, que equaliza a pressão e evita a formação de aerossol. Estudos estão sendo conduzidos para avaliar a eficiência desse dispositivo e os resultados demonstraram uma redução da contaminação de superfícies, mesmo quando o fármaco não foi preparado na cabine de segurança.5

Os trabalhadores devem ter conhecimento do risco e de qual é a técnica adequada para manipular estas substâncias e, ainda, devem utilizar os equipamentos de proteção individual, tais como: avental, calça, cobressapato, máscaras e respirador, luvas, óculos de proteção e viseira.24,32

Vigilância à Saúde

Existem condições fisiológicas e patológicas, congênitas ou não, que podem constituir condições de susceptibilidade ou que podem ser agravadas pela exposição ocupacional aos antineoplásicos e que, portanto, devem ser atentamente avaliadas, seja nos exames pré-admissionais, seja nos periódicos. São situações a considerar, com particular atenção: gravidez e aleitamento; talassemias, hemoglobinopatias, carência de glicose-6-fosfato-desidrogenase eritrocitária; anemia, leucopenia, plaquetopenia de qualquer origem; imunodeficiência congênita ou adquirida; alterações na funcionalidade hepática ou renal; exposição profissional anterior à radiação ionizante ou a substâncias carcinogênicas; terapia precedente capaz de induzir hipoplasia medular, em particular tratamento com fármacos antineoplásicos ou radiação ionizante; condições de atopia.34

A vigilância sanitária se baseia na anamnese laboral; anamnese fisiológica, com avaliação dos hábitos pessoais; anamnese patológica remota e próxima, com atenção ao uso de medicamentos; exame objetivo, com particular avaliação da cute e dos anexos; exame de urina; exame hemocromocitométrico com contagens de glóbulos brancos, vermelhos, plaquetas e reticulócitos; testes de funcionamento hepático e renal. Algumas modificações podem ser efetuadas de acordo com os dados clínicos do trabalhador. A freqüência das visitas periódicas deve ser estabelecida em função do nível de exposição e, via de regra, deve ser anual. É necessário proceder à vigilância sanitária imediata em caso de exposição anormal aos antineoplásicos em situações patológicas em que se suspeita origem ocupacional.34

Descarte Ambiental dos Fármacos Antineoplásicos

Todos os materiais residuais dos procedimentos de manipulação dos antineoplásicos devem ser considerados lixo hospitalar especial e devem ser descartados de acordo com os procedimentos do local, com rigorosa atenção quando da liberação para o meio ambiente.

Quase todos os antineoplásicos são sensíveis ao processo de incineração na temperatura em torno de 1.000/1.200ºC. Este processo destrói a molécula principal da substância, mas pode dar origem a derivados de combustão que conservam a atividade mutagênica. É, portanto, oportuno efetuar um tratamento de inativação química (hipoclorito a 10% por 24 horas) antes de enviar o material para o processo de incineração. A urina dos pacientes que recebem tratamento antineoplásico também deve ser inativada antes do descarte.5,24

 

COMENTÁRIOS

Os dados apresentados na literatura demonstram a importância de efetuar a manipulação dos antineoplásicos em condições de proteção, isto é, utilizando medidas ambientais e pessoais que possam evitar o contato e a absorção dessas substâncias por parte dos trabalhadores.

Esses fármacos devem ser manipulados por profissionais capacitados e informados sobre os riscos potenciais a que estão expostos e sobre as recomendações a serem seguidas, em todas as fases de contato com esses agentes. Assim, parece pertinente sugerir aos centros hospitalares envolvidos no tratamento de pacientes com câncer que elaborem e promovam cursos de capacitação e recapacitaçâo para os trabalhadores, implementem programas de monitorização ambientais e biológicos, de vigilância à saúde e de gerenciamento dos resíduos sólidos produzidos.

Finalizando, é fundamental que se defina e revise, periodicamente, as normas e os procedimentos sobre o uso dos agentes antineoplásicos em conjunto com os trabalhadores envolvidos direta ou indiretamente nesta exposição.

Essas são algumas medidas recomendadas para controlar a exposição e proteger a saúde dos indivíduos ocupacionalmente expostos aos agentes antineoplásicos.

 

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